Oxenfree entrou na minha pequeníssima biblioteca de jogos digitais devido a um bundle e por lá ficou durante algum tempo até 2017, ano em que finalmente decidi jogá-lo por mero acaso. Na altura vivia no Fundão, não tinha muito para fazer e queria um jogo novo. Decidi dar-lhe uma hipótese.
Quando dei por mim, já tinha acabado o jogo e cerca de seis horas tinham passado. Assim quase como por magia, uma magia muito única de videojogos particularmente bons, tinha mergulhado completamente no jogo. Após uma pausa para comer qualquer coisa, voltei ao jogo. Afinal de contas, o mesmo aliciava-me a uma segunda volta.
No total, já devo ter jogado o jogo umas seis vezes, quatro delas no PC, uma na Switch e uma no telemóvel, embora a última não tenha sido uma grande experiência, devido ao tamanho do mesmo.
Oxenfree é um dos meu jogos mais jogados, juntando-se assim a um grupo prestigiado de videojogos, ao lado de Final Fantasy VIII, Prince of Persia: The Sands of Time , Dragon Age: Origins, Mass Effect 2, Assassin’s Creed Revelations e The Elder Scrolls V: Skyrim. Todos eles foram jogados pelo menos três vezes e Oxenfree encontra-se em quarto lugar. Oxenfree é uma experiência completamente única, não só pela maneira como introduz e constrói-se à volta do conceito de loops temporais, mas também como nos consegue relacionar com as suas personagens e como conta tão bem uma história que está no limbo entre ficção científica e sobrenatural. É uma delícia autêntica, é a nossa sobremesa favorita feita pelo melhor chef de sempre.
Quando Oxenfree II foi anunciado, fiquei entusiasmada e ansiosa. O estúdio Night School Studio já tinha mostrado que sabia o que estava a fazer, mas tinha algum receio que pudessem “estragar”, de certa forma, toda a magia do primeiro jogo com uma sequela. Foi aquela mistura de “há coisas que não devemos mexer e deixar como está” e “será que Alex irá conseguir escapar ao loop temporal ou vamos ter um novo drama como prato principal”.
Adquirir Oxenfree II: Lost Signals quando foi finalmente lançado no dia 12 de Julho foi das decisões mais fáceis deste ano. O jogo mantém-se muito fiel ao seu antecessor em alguns pontos. A arte e a vibe continuam lá, muito únicas e especiais, mas rapidamente senti que faltava algo. O jogo inicia logo num momento de tensão, no meio de uma tempestade, sem sabermos o que raio se está a passar, uma direção oposta à do seu sucessor, que tem um tom bem mais calmo. Somos apresentados à nossa protagonistas, Riley, que é mais um contraste com o jogo original. Alex tem a energia de uma jovem adolescente; Riley tem a calma de uma mulher adulta e isso reflete-se muito bem nos seus diálogos e reações. Estes opostos são interessantes e trazem uma nova perspetiva ao jogo, mas tiram um pouco a sua “magia”. Não, esta afirmação é injusta. A magia não é retirada: na verdade, não é bem integrada com esta nova protagonista. Riley com a sua perspetiva adulta poderia ter trazido uma dinâmica interessante em Oxenfree II mas a mesma não acontece. Houve uma tentativa que falhou. Mesmo o nosso companheiro de viagem, continuando o que aconteceu no primeiro jogo, é uma personagem interessante: um adulto com uma crise existencial que não sabe bem o que fazer da sua vida. No entanto, opondo-se ao que Oxenfree fez com Alex e Jonas, Riley e Jacob não se integram tão bem nesta sequela. Como se fossem duas histórias em paralelo, a das nossas personagens e o drama principal, ao invés das mesmas se integrarem e serem uma impulsionadora da outra.
Viagens no tempo continuam presentes neste jogo, inseridas de uma maneira mais interessante. Riley consegue abrir portais temporais, posicionados estrategicamente para a resolução de quebra-cabeças e para nos ajudar no avanço da história. O rádio também está de volta, embora a sua necessidade seja introduzida mais à frente. A primeira coisa que me fez sentir saudades do primeiro jogo foi os pequenos indicadores de segredos. Em Oxenfree, ajuntamentos de pedras indicavam um local para sintonizar-mos a uma frequência, que ia alternando consoante o sítio, e que nos dava um vislumbre de comunicações e interações do passado, que é como quem diz, com os Afundados. Na sequela, esses marcos já não existem. Não é que tivessem que existir, mas gostava de ter algo similar, algo que fosse opcional a dar-nos mais lore sobre esta realidade. Neste aspeto, senti o jogo mais vazio, de certa maneira.
Aliás, ao longo do jogo senti-o muito vazio. O mapa é maior, temos mais zonas por onde podemos explorar, mas a vontade de explorar cada recanto, de achar novas pistas ou conhecimento escondido rapidamente desapareceu. Em muitos momentos de travessia, onde tínhamos que chegar a um novo objetivo, foram marcados por algum aborrecimento. O jogo é visualmente lindíssimo, mas não é assim tão incomum não acontecer nada durante um largo período de tempo. Neste aspeto Oxenfree fez um melhor trabalho. Ao ser um jogo mais condensado e com coisas a acontecer ao longo do tempo, nunca me senti aborrecida a andar. Muito menos a voltar atrás nalguma zona para descobrir algum segredo escondido. Em Oxenfree II a vontade de voltar atrás para descobrir algo novo pura e simplesmente não existe.
Por outro lado, o suspense que me caracterizou tanto o primeiro jogo não está assim tão presente no segundo. Embora nos primeiros minutos fiquemos “Espera… estamos outra vez presos num loop?”, o que levanta a questão se os Afundados estão outra vez a fazer das suas, deixando assim uma curiosidade para saber o que raio vai acontecer, é com relativa rapidez que ficamos a saber que são uns miúdos que andam a brincar com o que não devem. Mais para a frente do jogo, é-nos revelado que os miúdos andam a criar pactos com os Afundados, mas é difícil criarmos relações com os mesmos. Aliás, durante todo o jogo a maior interação com outras personagens que temos é com Jacob, que nos deveria ajudar com as tarefas que nos foram assignadas. A interação com as outras personagens foi algo muito importante no primeiro jogo, afetando as nossas relações com as mesmas e o final do jogo. Aqui, a interação está praticamente inexistente. Não só não falamos praticamente com ninguém, como também não sentimos a vontade de interagir com os outros donos de walkie-talkies. Mesmo a minha exceção, o marinheiro Nick, personagem hilariante que rapidamente ganhou o meu afeto, foi raro alguma personagem me impactar, como tinha acontecido no primeiro jogo. Mais porque as interações serem raras e muito esporádicas do que propriamente por estarem mal escritas.
Não consigo bem apontar onde é que algum do meu interesse se perdeu, mas arriscaria a dizer que foi relativamente ao início, quando o nosso transmissor afeta os planos dos adolescentes na ilha de Edwards. Diria que perdeu-se ainda mais quando andamos de um lado para o outro da ilha e temos pouquíssima interrupções por parte dos Afundados ou até mesmo por Alex, que descobrimos mais tarde também envolvida nas peripécias, numa tentativa de sair do loop. Os portais temporais que são apresentados logo ao início, são parcamente utilizados ao longo do jogo. São a nossa maneira de solucionar quebra-cabeças que vamos encontrando, esses também raríssimos, mas seria interessante vê-los a serem usados como maneira de comunicarmos com Maggie Addler ou até mesmo com uma das versões de Alex, visto que a mesma está presa no tempo, afetando assim como o jogo se procede.
O walkie-talkie é outra mecânica nova no jogo e esperava mais do mesmo. Imaginei a possibilidade de o utilizarmos como comunicação com os Afundados ou alguns dos membros do grupo de Alex, até mesmo com as personagens que vamos conhecendo ao longo do jogo, mas está lá só para ser usado apenas em certos momentos, esses muito limitados. Tal como os portais, senti que houve aqui uma oportunidade perdida para enriquecer ainda mais o enredo do jogo e o próprio suspense. Sinto que o walkie-talkie foi assim como que colocado como algo secundário, o que me deixa com alguma pena.
Admito que esperava encontrar mais neste jogo, mas quando o acabei não senti imediatamente o mesmo que senti com Oxenfree: a vontade voltar a jogar, de experimentar novas variações na escolha de diálogo. Vou querer fazê-lo, pois a curiosidade é a minha maior sedutora, mas não foi uma vontade imediata. No final, não senti uma conexão suficiente com Riley ou Olivia para querer saber qual delas “sacrificava”. Durante a minha jornada, pouco foi aprofundado sobre as outras personagens e até mesmo o culto. Melhor dizendo, o que foi partilhado foi muito rápido, com pouca investigação e muito superficial, não havendo assim nada de muito complexo por detrás dos motivos do grupo de três adolescentes de abrir o portal dos Afundados. Adicionando a isto, não há pressão em fazer as coisas, nem mistérios para resolver. No primeiro jogo, existem alguns momentos que o jogador sente a pressa de fazer coisas, correndo o risco de, se não se despachar, de algo terrível de acontecer. Isso não está presente neste.
Resumindo: muito do carisma do primeiro não está presente neste jogo. Falta qualquer coisa. Talvez o problema seja meu e não do jogo. Dar-lhe-ei uma segundo hipótese daqui a uns tempos e quem sabe, a minha opinião poderá mudar. Mas é um vazio que sinto neste momento. Um vazio não porque joguei algo absolutamente incrível, mas mais uma apatia de não saber bem o que sentir pois não despertou algum interesse em mim.
Não que tudo seja negativo. O dilema de Riley foi interessante e bem apresentado. Se escolhermos as opções corretas, vislumbramos a crise pela qual Riley está a passar naquele momento, que poderá suscitar empatia em algumas jogadoras. Até Jacob e a sua clara crise existencial é algo que irá ressoar com muitos dos jogadores que tenham mais de vinte e cinco anos. Ele sente-se perdido e a sentir-se um inútil, questionando constantemente a sua vida, o que é que ele está a fazer e se é “alguém”. Claro que isto implica que o jogador o aborde corretamente, mas Jacob é uma personagem que sinto irá deixar muitos com o “Ele é como eu.” e isso eu dou de valor à escrita.
Por outro lado, o jogo permite que algumas conversas continuem quando mudamos de zona, algo que não acontecia no primeiro e que eu agradeço. Havia alturas em que outras conversas começavam entretanto, interrompendo assim a conversa anterior, ou uma transmissão pelo walkie-talkie cortava, mas foi uma boa adição ao jogo.
Tenho que também dar uma especial atenção e carinho a um fator que passa ao lado de alguns jogadores, mas é das primeiras coisas que vou averiguar. Embora a acessibilidade seja uma delas (não tenho muitos positivos neste jogo a apontar) a língua do jogo é outra e aqui Night School Studios tem o meu elogio. O áudio é em inglês mas têm tradução em português de Portugal, algo, infelizmente, raro nos videojogos atualmente. É comum o português ser do Brasil (que Oxenfree II: Lost Signals também tem) mas de Portugal? Um especial agradecimento, do fundo do coração, a toda a equipa envolvida na sua tradução e assegurarem que estava com qualidade. Já não me lembro a última vez que vi uma tradução com tanta qualidade e Oxenfree II tem muitíssima qualidade na sua tradução para português de Portugal! 👏👏👏
Oxenfree II: Lost Signals faz jus ao nome. Sinais perdidos é mesmo como definiria o jogo. Perde muito do carisma e encanto do primeiro jogo, mas ao mesmo tempo dá a sensação de que foi uma sequela criada para tentar cativar jogadores novos. Não sei se o consigo recomendar, pois é daqueles jogos que é mesmo muito subjetivo, mesmo para quem já jogou o primeiro. Acho que quem jogou o primeiro vai apreciar mais este comparando com quem não o jogou. Por outro lado, Oxenfree II deixou-me ainda mais convencida: Oxenfree é um jogo completamente único e estupidamente bom. Se ainda não o jogaram, joguem. Não se irão arrepender. Quanto a este, se calhar esperava por uma promoção. Ou então joguem no telemóvel, se tiverem uma subscrição de Netflix, visto que faz parte do novo catálogo da Netflix Games1. O primeiro também faz parte deste catálogo, por isso aproveitem!
Embora aparente estar mais fresquinho, mantenham-se hidratados, coloquem protetor solar e não se esqueçam - sigam o meu trabalho noutras plataformas!
🐘 Mastodon
📼 YouTube
📰 Discord
https://help.netflix.com/pt-pt/node/121442